A tradução em sala de aula de LE não somente deve ser usada como aliada ou como um último recurso, mas também pode ser usada de forma planejada, como primeiro recurso, com a função de facilitar e simplificar o processo de ensino-aprendizagem. Costa (1988) argumenta a favor da tradução em sala de aula apontando alguns dos muitos fatores favoráveis à prática tradutória:
Na realidade, a tradução pode ser considerada como mais uma alternativa ao lado da compreensão oral e escrita e da produção oral e escrita. Do ponto de vista prático, o hábito da tradução (tanto da língua materna para a estrangeira como em sentido contrário) resulta muito útil, porque são inúmeras as situações (tanto no país quanto no exterior) em que se necessita a habilidade tradutória (estudo de textos, auxílio a pessoas monolíngues, tradução de cartas e documentos, etc.) (COSTA, 1988, p. 290)
Cook (1998, apud LIBERATTI, 2012) cita algumas das vantagens em se aplicar a tradução no ensino-aprendizagem de LE:
I- A tradução é conveniente, já que é o meio mais rápido e eficaz para se explicar uma palavra ou regra gramatical. Assim, quando surgirem dúvidas por parte dos alunos em relação a palavras desconhecidas, o professor pode ganhar tempo ao passar a tradução da palavra ao invés de ter de se desgastar com mímicas, desenhos e jogos de adivinhação. Essa prática é vantajosa principalmente com alunos de níveis iniciantes, mas serve para todos os níveis. Além disso, ao se usar a tradução, não se corre o risco de o aluno entender errado o significado de uma palavra;
II- A tradução é uma atividade de auxílio à aquisição. Ela não precisa ser o meio exclusivo de aprendizagem de uma segunda língua, pois não necessita ser empregada a todo o momento, como regra. Ao invés disso, pode ser utilizada como atividade complementar a qualquer outro método, sendo desenvolvida vez ou outra, de maneira organizada, planejada, com foco nos resultados obtidos pela prática;
III- A boa tradução é encarada, por muitos alunos, como um fim em si mesmo. Isso justificaria o uso da tradução em sala de aula como um exercício aplicado não somente ao aprendizado da LE, mas também como base para a prática de uma boa tradução. O aluno pode aprender a LE de maneira mais natural, sem nem mesmo perceber o processo de aprendizagem pelo qual está passando, simplesmente pelo fato de gostar da prática da tradução em si;
IV- A tradução pode conscientizar quanto ao uso correto da forma. O exclusivo enfoque comunicativo pode gerar imprecisões formais na LE, uma vez que seu foco é o conteúdo e não a forma. Com isso, a prática da tradução pode focar a forma, e sua aplicação correta e, também, desenvolver a correção de usos imprecisos de estruturas da LE;
V- Os estudantes aprendem a lidar com dificuldades advindas do texto fonte a ser traduzido. Os exercícios de tradução limitam o aluno ao texto selecionado para a atividade tradutória (uma letra de música, por exemplo). Isso faz com que os alunos aprendam a lidar com aquele texto e com a transferência entre as línguas trabalhadas;
VI. A tradução ajuda a chamar a atenção para diferenças sutis entre LM e LE. As diferenças sutis existentes entre uma língua e outra podem ser evidenciadas por meio da tradução, uma vez que o professor, ao usar a LM em comparação com a LE, pode demonstrar que nem toda expressão tem um equivalente exato em outra língua, discutindo, junto com os alunos, qual seria a expressão mais próxima na LM.
Podem-se alistar benefícios tanto para discentes como para docentes no uso da tradução no processo de ensino-aprendizagem de LE. Aos que desejam adquirir a segunda língua um método de tradução criativo e contextualizado facilitará a comunicação oral efetiva na LE, já que o aluno se vê na obrigação de enfrentar o problema apresentado e aplicar o que aprendeu. Aos que ensinam, torna-se uma alternativa prática de ensino e avaliação. Além do mais, utilizar a tradução após tanto tempo sendo estigmatizada trará luz sobre uma nova era no ensino e aprendizagem de LE, retomando seus benefícios num contexto de um mundo globalizado e sedento de comunicação.
Existem teóricos que consideram, por vários motivos, não somente possível, mas até necessária uma reabilitação do uso da tradução em sala de aula. Harbord (1992), por exemplo, afirma que o hábito de traduzir na própria língua seja a estratégia preferida pelos estudantes, um fenômeno natural e inevitável no processo de aprendizagem de uma LE:
[…] os alunos inevitavelmente (e mesmo inconscientemente) farão uma tentativa de igualar a estrutura da língua estrangeira ou um item lexical com seu correlato mais próximo ou o mais comum na língua materna, independentemente de haver ou não a oferta ou a permissão do professor para traduzir. (HARBORD, 1992, p. 351)
Outra vantagem do uso da tradução, e então da LM em sala de aula, é que permite uma utilização eficiente do tempo disponível, ou seja, do tempo necessário para explicar um assunto. Em outras palavras, segundo Harbord (1992) e Atkinson (1993), muitos docentes julgam com razão a tradução válida em termos comunicativos, particularmente, em três situações específicas:
1. Na comunicação docente-discente;
2. Na relação docente-discente;
3. Na aprendizagem.
Na primeira categoria seriam mais evidentes as vantagens do uso da tradução, não somente por que facilita a passagem das mensagens linguísticas, mas até porque permite economizar tempo em sala de aula. Esta última é uma das principais razões a favor do uso da LM. Algumas das estratégias sugeridas por Atckison (1987) para facilitar o andamento da aula são:
1- Explicar o significado de uma palavra mediante a tradução;
2- Controlar a compreensão de uma estrutura da LE na LM;
3- Permitir ou estimular os estudantes para dar a tradução de uma palavra como controle de sua compreensão;
4- Elicitar o vocabulário dando o equivalente na LM;
5- Dar instruções que dizem respeito a uma atividade, na LM, facilitando a comunicação entre docente e estudante.
Diversas são as atividades que podem ser realizadas com o intuito de inserir a tradução de forma sistemática nas aulas, basta haver planejamento e criatividade por parte dos professores de LE. A seguir, reúnem-se sugestões de atividades para o uso cotidiano da tradução em sala de aula pelos docentes:
Atividade I: O professor propõe uma atividade de múltipla escolha, em que coloca uma palavra em LM e os alunos têm opções para assinalar em LE. Podem ser escolhidas palavras com falsos cognatos ou de acordo com o conteúdo que o professor gostaria de abordar. Essa atividade ajuda os alunos a testar seus conhecimentos;
Atividade II: O professor passa a biografia de alguma pessoa famosa (cantor, ator, escritor, entre outros) em LE e os alunos tentam adivinhar quem é, podendo pesquisar em dicionário bilíngue ou em algum outro material que o docente disponibilizar;
Atividade III: É uma atividade voltada especialmente para níveis iniciais, onde os alunos devem preencher lacunas. O professor escolhe figuras de diversos animais com o nome de cada um em inglês e ao lado de cada figura deve ter um espaço para preencher com a letra correspondente ao nome do animal em português;
Atividade IV: O docente utilizará recursos audiovisuais, tais como um vídeo, um documentário ou uma animação, que será exibido em LE, porém sem legenda na LM. Vídeos de curta-metragem são mais apropriados para essa atividade. Durante a exibição os alunos deverão estar atentos e escrever em LM as palavras que estão em LE que conseguirem identificar ao ouvir o vídeo. Posteriormente, cada aluno fará com auxílio de dicionário a tradução das palavras em LM que distinguiu ao assistir o vídeo, as escrevendo do lado em LE (LIBERATTI, 2012);
Atividade V: Nesta atividade, propositalmente, o professor prepara textos com palavras embaralhadas e mal traduzidas, podendo utilizar falsos cognatos. Desta forma o aluno deverá distinguir as traduções que estão feitas de forma incorreta, desembaralhar a frase e escrever a frase correta em LE e logo abaixo a sua tradução, desta feita correta, em LM (LIBERATTI, 2012).
A partir das atividades acima propostas, os alunos são estimulados criticamente; tomam consciência de erros comuns cometidos na tradução de LE para LM, e vice-versa; ampliam a sua visão cultural; têm suas percepções auditivas e visuais estimuladas para o entendimento da LE; exercitam suas habilidades e aumentam sua compreensão em uma LE; utilizam recursos diferentes, divertidos que estimulam a sua atenção em aspectos específicos da língua, fazendo com que tenham autoconfiança ao longo que avançam nos níveis de aprendizagem.
As sugestões de atividades têm o intuito de estimular os docentes a procurar entender mais sobre a tradução planejada e a usar sua criatividade, desta forma trazendo para a sua realidade e da instituição de ensino em que atua essa ferramenta útil, porém esquecida e envolta de pré-conceitos, que é a tradução no processo de ensino-aprendizagem de LE.
(Fragmento do artigo científico: A TRADUÇÃO COMO ALIADA NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS)
Acadêmicas: Laíza Pitzer, Elisângela Liberatti, Emília Zimmermann, Karine Ramos
Curso de Letras / Inglês - Português - UNISEB - Polo Florianópolis - 2012